• 6. Parte 06

    Na manhã seguinte, nossa amiga chegou na escola e ouviu as garotas do basquete reclamarem que os rapazes dominavam a quadra nas horas livres para a prática de esporte. Mesmo as meninas tendo implorado para poderem jogar também e tendo um dia na semana combinado com o professor de Educação Física. Segundo elas, os meninos chegavam, começavam a xingar, iam entrando na quadra e empurrando até que elas se sentissem pressionadas e deixassem a quadra.

    — Isso não é justo! — esbravejou a menina mais velha do time — Precisamos convencer o professor Maurício para que ele faça com que a nossa vez seja respeitada. Temos mais meninas do que meninos no colégio, gostamos de jogar tanto quanto eles.

    — Não adianta, Andreia, ele é homem e vai defender os meninos. Vai dizer que temos que entender que eles têm que treinar para o campeonato regional e que devemos fazer ballet ou artes. — disse outra menina.

    Deia pensou que deveriam existir regras de convivência para o uso da quadra e todos deveriam poder usá-la, de acordo com as necessidades. Mas, nada disso daria certo se o professor, responsável por fazer a regra ser cumprida, fizesse de conta que isso era uma bobagem e, por ser homem, acabasse defendendo os meninos ou fazendo de conta que não era um problema a ser discutido.

    — Precisamos de igualdade! — disse Deia quase sem querer.

    Naquele dia, todas as meninas falavam sobre a mesma coisa. Algumas até achavam que deviam deixar a quadra para os meninos, que isso era normal. Mas um grupo defendia a proposta de ter um dia na semana da quadra só para elas. E Deia estava integrando uma comissão para conversar com a professora Simone, que era a coordenadora, para ajudá-las a conseguir o apoio do professor Maurício, que também era o treinador da equipe masculina de futebol.

    Elas saíram de lá com um acordo formal, assinado pelos dois professores. No dia seguinte, Deia foi com as amigas assistir ao jogo de basquete para comemorar a conquista. Afinal, havia sido muito bom agirem em vez de só reclamarem. Paz não é passividade! — relembrou um filme que assistira sobre o grande pacificador, Mahatma Gandhi — É preciso lutar por ela, mas sem violência.

    Tudo ia bem no começo do jogo. De repente, os meninos chegaram, gritando palavrões. Mexendo com as meninas, levantando suas saias. Ficavam mandando beijinhos, jogavam bolinhas de papel e tiravam sarro das garotas, que logo ficaram com vergonha, se sentiram ameaçadas e foram embora.

    —  Isso é uma forma de violência! — gritou Deia. 

    Ela estava muito aborrecida com a invasão dos garotos. Eles não estavam cumprindo o acordo. Tentaram afastar as meninas pelo medo. Sentia vontade de bater neles, mas essa agressividade ela não queria usar por saber que seria violenta. E ela ficou pensando no que fazer.

    Foram três dias sem conseguir sequer comer direito. Se o acordo firmado, assinado, com o professor e a coordenadora não valiam de nada, o que iria resolver? Deia sentia-se pesada, os pés arrastavam-se pela casa, mal tinha vontade de ir à escola. Ter o acordo no papel fazia alguma diferença? Muitas meninas haviam simplesmente desistido. Só as garotas do basquete ainda conversavam com ela sobre isso. 

    O pior, era à noite, quando deitava a cabeça no travesseiro, não conseguia dormir, porque os pensamentos a atrapalhavam. Lembrava das coisas boas que havia conseguido, mas sentia-se puxada para baixo quando a cara de sarro e satisfação dos garotos vinha na sua memória. Uma lágrima escorreu dos seus olhos, e novamente, aquela sensação de engasgo voltou para a sua garganta. Sentia-se impotente.

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